MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 1 de julho de 2012

Inseminação artificial em abelhas busca aumentar produtividade


Sêmen de zangões de elite é introduzido em rainhas selecionadas.
Processo de experimentos envolve criadores e cientistas.

Do Globo Rural

A técnica de inseminação artificial, que consiste em introduzir o sêmen de um bom reprodutor em uma fêmea selecionada, tem melhorado a genética e a produtividade dos rebanhos brasileiros há algum tempo. A aplicação dessa técnica em abelhas também existe, apesar de ser menos conhecida.
Uma flora espetacular e um clima favorável fazem com que a vocação do Brasil pra criação de abelhas não seja discutida, principalmente depois que foram dominadas as técnicas para lidar com as africanizadas, mistura de abelhas européias com africanas. Embora "agressivas", são muito mais produtivas.
Graças a elas, a produção de mel, própolis e geléia real cresceu muito no país, mas a produtividade média por colmeia continua baixa, entre 20 e 25 quilos de mel por ano.
Para o biólogo Ademilson Espencer, pesquisador da Universidade de São Paulo, com as flores que tem, o Brasil poderia chegar facilmente a 80 quilos. Para isso, teria que investir em melhoramento genético, com inseminação artificial de abelhas. “A produtividade está intimamente relacionada com o melhoramento genético e, sem inseminação, não há um melhoramento genético feito na sua totalidade”, afirma.
Toda colmeia é composta pela rainha, abelha maior, com uns dois centímetros, e mãe de todas as outras. As operárias, bem parecidas com a rainha, mas menores, têm cerca de um centímetro e meio. Os zangões, machos de tamanho intermediário, têm o corpo um pouco mais robusto.
A ideia do pesquisador é coletar sêmen de zangões de elite e introduzir em rainhas selecionadas para gerar colmeias mais produtivas. O assunto não é novo. A técnica já frequenta laboratórios de pesquisa das universidades do Brasil desde a década de 1960, mas só agora começa a dar as caras em uma produção comercial.
Esse impulso se deve, em boa parte, aos esforços do apicultor Cézar Ramos Junior, que viu a inseminação na rotina de criadores de países como Argentina e Estados Unidos e correu atrás. Conheceu Espencer e propôs uma parceria.
O acordo firmado entre o apicultor e a universidade vai até 2015. O zootecnista colombiano Omar Martínez, doutorando da USP, coordena os experimentos. “A gente tenta criar um programa de melhoramento genético e fazer parceria com os produtores para poder levar esse material, essa tecnologia no campo”, afirma.
O negócio principal de Cézar é a produção de uma própolis rara e com propriedades medicinais, a própolis verde. O apicultor conta hoje com três mil colmeias para abastecer sua empresa, que fica no município de Bambuí, em Minas Gerais.
Na região, as abelhas encontram o alecrim do campo, planta que fornece a resina para fazer essa própolis, que é muito valorizada no mercado internacional. “A abelha coleta essa resina das plantas e acrescenta cera e parte da sua saliva, fazendo a composição final da própolis, que são essas paredes aqui nas frestas”, afirma Cézar.
O trabalho de pesquisa vai ser todo voltado para a produção de própolis verde, mas poderia ser para diminuir a agressividade das abelhas, melhorar a sanidade das colmeias e a produção de mel. A seleção genética é feita de acordo com o interesse do apicultor.
Para dar início ao programa, Cezar e Omar escolheram as 50 caixas mais produtivas da empresa, mas, no processo de seleção, não é só a produtividade que conta. Eles observam também outras qualidades importantes, como a resistência a pragas e doenças. O pesquisador recolhe exemplares das caixas escolhidas para avaliar no laboratório a incidência de parasitas, especialmente a varroa, ácaro que suga a hemolinfa, o “sangue" das abelhas.
Omar faz um teste para avaliar o comportamento higiênico de uma colmeia. Para isso, delimita uma área e mata cem crias na fase de pupa. O que se espera de uma boa colmeia é que, no dia seguinte, toda a área esteja limpa.
Em outro apiário, já há um teste do comportamento higiênico pronto para ser mostrado, com 24 horas. “É uma colmeia 100% higiênica. Por enquanto, está sendo aprovada, mas não podemos esquecer que, nessas observações, a gente não pode se basear em uma só”, diz Omar.
Depois de muito testar, Omar escolheu as dez colmeias campeãs e as levou para o campus da USP, em Ribeirão Preto, São Paulo. A primeira coisa a se fazer é produzir rainhas das colmeias que foram selecionadas em Bambuí. O processo de produção de rainhas, já praticado por muitos apicultores no Brasil, é fundamental para fazer a inseminação.
Uma rainha nada mais é do que uma larva comum que recebeu uma super alimentação. Em uma colmeia, quando a rainha fica velha, fraca ou morre, as operárias naturalmente escolhem algumas larvas para alimentar exclusivamente com geleia real, formando células de cria maiores, as realeiras. A primeira que nasce mata as outras e vira a nova rainha.
Na produção artificial, Omar coloca cúpulas plásticas nas caixas escolhidas. As cúpulas vão para o laboratório junto com um favo de cria, com larvas de 24 horas. Depois, é necessário colocar uma gota de geleia real diluída em água destilada no fundo das cúpulas, e cuidadosamente transferir a larva para lá.
De cabeça para baixo, as larvas vão voltar paras colmeias sem rainhas ou com rainhas presas na parte inferior da caixa. Órfãs, e tendo as cúpulas maiores à disposição, as abelhas operárias serão estimuladas a alimentar as larvas somente com geleia real, transformando todas elas em rainhas.
Passados dez dias, as cúpulas aceitas e fechadas dentro da colmeia vão para uma estufa com umidade e temperatura controladas. “Essas realeiras chegaram aqui faz dois dias, elas são tiradas dos sarrafos, colocadas em frascos individuais pras rainhas nascerem. A gente está escolhendo a mãe dessas rainhas por características de produção”, afirma Omar.
Para acelerar o processo de melhoramento, Omar costuma mandar para o Cezar, em Bambuí, algumas dessas rainhas virgens para se acasalarem lá, naturalmente. Só desse jeito, a produção já aumenta. Uma marquinha colorida identifica a rainha, que vai para uma gaiola apropriada, junto com sete ou oito operárias, que, no transporte, vão se alimentar de uma pasta de açúcar e mel.
As que ficaram voltam para a colmeia dentro de uma telinha. Com mais cinco ou seis dias, atingem a maturidade sexual e estão prontas para a inseminação. Na natureza, seria o momento em que a rainha deixaria a colmeia para fazer seu voo nupcial. Zangões de diversas partes sentiriam seu cheiro a quilômetros de distância e iriam ao seu encontro.
Em imagens, feitas por Omar, centenas de zangões tentam acasalar com a rainha virgem presa em uma gaiola, e entre sete e 17 deles conseguem. Cada um deixa de seis a dez milhões de espermatozóides dentro dela e morre em seguida.
Esse material migra para a "espermateca", uma estrutura que a rainha tem no abdômen e que conserva o sêmen ativo por toda sua vida, que, na natureza, pode passar de dois anos. De volta ao processo de inseminação, com as rainhas virgens preparadas, é hora de se preocupar com o pai.
Uma colmeia forte e bem alimentada pode suportar até mil zangões. Na teoria, são necessários apenas oito deles para inseminar uma rainha, mas, na prática, precisa-se capturar bem mais.
A fumaça traz os zangões até a superfície da colmeia. Pacientemente, Omar procura e coleta um a um. Tenta pegar, pelo menos, uns 30 deles para cada rainha que pretende inseminar. Todo cuidado é pouco, pois zangões são extremamente sensíveis, não aguentam muito tempo na gaiola e podem morrer com qualquer variação de temperatura. “Os ovos fecundados dão origem às fêmeas, sejam elas operárias ou rainhas. Ovos da rainha que não são fecundados dão macho, então o zangão é única e exclusivamente filho da rainha. Vai carregar toda a informação genética da mãe”, explica Omar.
Para extrair o sêmen, Omar vai ter que matar o macho. “Eu viro as asas, faço uma boa pressão na cabeça e no tórax. Com muito cuidado, a gente faz a eversão (retirada do endófilo, aparelho reprodutor masculino) completa. Aí você pode observar o muco e o sêmen”, afirma o zootecnista.
A diferença é sutil: o sêmen é meio alaranjado, e o muco, mais branquinho. Um microscópio e uma seringa de precisão ajudam a coletar só a parte mais escura. O processo é repetido inúmeras vezes, e nem todos os zangões têm sêmen.
Devagar, todo o sêmen necessário é armazenado no capilar. Um equipamento especial vai ajudar a preparar a rainha para receber o material. São dois ganchos para abri-la, um lugar para apoiar a seringa com sêmen e um tubinho de acrílico, para prender a rainha.
Mesmo com a rainha anestesiada pelo gás carbônico, o processo todo exige muita delicadeza. Cuidadosamente, o pesquisador abre a abelha. Omar posiciona a seringa com o sêmen. São, no mínimo, oito microlitros de sêmen por rainha.
Omar aproveita a anestesia e corta uma das asas da rainha inseminada para que ela não tente nenhum voo nupcial. O zootecnista ainda cola um número em seu tórax para identificá-la, e devolve a matriz para a gaiolinha, para que acorde lá. “Vinte e quatro horas após a inseminação, vai receber mais um choque de CO2. Esse CO2 vai ajudar a ativação dos ovários, a migração espermática e ajuda para a rainha começar a nossa postura”, explica.
As abelhas inseminadas ainda estão sendo avaliadas na universidade e devem começar a chegar ao apiário de Cézar, em Bambuí, em seis meses. “A gente sabe que é em longo prazo, não é em curto prazo, o resultado, mas a gente espera, no final, um resultado muito positivo no aumento da produção da própolis verde, tanto em quantidade, quanto na qualidade”, diz Cézar.
Ainda levará alguns anos até que se saiba exatamente quanto esse processo todo vai contribuir para aumentar a produção de própolis verde de Cézar, mas os ganhos virão. Ainda mais se, inspirados por essa experiência, outros criadores também puderem ter acesso às técnicas de inseminação.
Para fazer a inseminação, são necessários equipamentos especiais e profissionais treinados. Apesar do custo alto, o processo, segundo os pesquisadores, pode valer a pena se a despesa for dividida por grupos de criadores.

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