MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sexta-feira, 8 de março de 2013

Tragédia em Oruro: só mudou quem sentiu a dor da morte


Conmebol voltou a ser pouco rigorosa. O Corinthians e suas organizadas só pensaram nos interesses do clube. Mas a Bolívia reagiu, mudando suas leis

O jovem Kevin Douglas Beltrán Espada, em foto postada na sua página no Facebook
O jovem Kevin Douglas Beltrán Espada, em foto postada na sua página no Facebook - Reprodução
As autoridades bolivianas já aprovaram um decreto que aumenta o rigor no controle da entrada de torcedores em estádios. Clubes, torcidas, administradores dos estádios e as próprias autoridades podem ser responsabilizadas em caso de acidente ou crime
Passados quinze dias da morte de Kevin Espada, de 14 anos, a tragédia de Oruro já parece afetar cada vez menos gente. Com exceção da família, ainda traumatizada com a perda do garoto - que era inteligente, dedicado e generoso, conforme relatos dos parentes e amigos -, o caso vai aos poucos sendo esquecido, confirmando os temores de quem achava desde o começo que a impunidade voltaria a imperar no futebol sul-americano. Depois de anunciar uma punição firme, com o fechamento dos portões nos jogos do Corinthians em casa, a Conmebol voltou ao normal - confirmando a reputação de conivente com a violência, autorizou o retorno dos torcedores ao estádio nas partidas do clube em casa. A entidade também voltou a mostrar mais apego ao dinheiro do que à segurança e à justiça: famosa pela habilidade em arrecadar altos valores através das multas mais diversas, cobrou mais 200.000 dólares do Corinthians como punição pelo uso do sinalizador que matou Kevin por seus torcedores. O San José também foi punido: terá de pagar 10.000 dólares por ter permitido que os visitantes entrassem no estádio com os sinalizadores.



Entre os corintianos mais fanáticos, a morte de Kevin também parece não ter feito grande diferença. As torcidas organizadas envolvidas no episódio se mobilizaram mais na defesa dos suspeitos presos na Bolívia do que na admissão de culpa pela tragédia (ainda que o disparo tenha sido acidental). Os torcedores estavam proibidos de acompanhar as partidas do time fora do Brasil, mas integrantes da facção Camisa 12 chegaram a estender uma faixa da torcida na partida de quarta, na distante Tijuana, fronteira entre o México e os Estados Unidos. Não foi a primeira vez que a torcida desrespeitou a punição preventiva anunciada pela Conmebol. Na partida disputada na semana passada, no Pacaembu, quatro torcedores foram à Justiça e garantiram a entrada no estádio, dizendo que tinham esse direito porque haviam comprado os bilhetes com antecedência. O silêncio das arquibancadas vazias teria sido adequado na primeira partida da equipe no torneio desde a tragédia. O luto no sétimo dia da morte de Kevin foi quebrado pelos gritos do quarteto. Mais barulho ainda fizeram as torcidas organizadas que se reuniram em plena Avenida Paulista no fim de semana para cobrar providências - não em relação à segurança nos estádios sul-americanos, mas sim pela libertação imediata dos acusados de envolvimento no episódio.

Responsabilidade - Na diretoria do Corinthians, a decisão anunciada pela Conmebol na quinta não agradou. Apesar de liberar o retorno dos torcedores às partidas no Pacaembu, o clube ainda se diz injustiçado, já que a proibição da venda de ingressos aos corintianos em partidas fora de casa foi mantida. O clube promete recorrer para derrubar essa última restrição aos seus torcedores. A direção continua sustentando que não tem responsabilidade alguma pelo caso - e também não anunciou qualquer tipo de mudança em sua relação com as torcidas organizadas. O Corinthians é o clube onde esses grupos têm mais força e influência. Mesmo depois dos episódios de violência envolvendo seus integrantes, as uniformizadas seguem tendo canal aberto para dialogar (e reivindicar). Entre todos os envolvidos, só quem sentiu mais de perto o peso da tragédia reagiu efetivamente a ela. Pouca gente ficou sabendo, mas a Bolívia já adotou mudanças para tentar evitar que o caso se repita. Com uma rapidez que poderia muito bem ser imitada pelos parlamentares brasileiros, as autoridades locais aprovaram um decreto que aumenta o rigor no controle da entrada de torcedores em estádios. Clubes, torcidas, administradores dos estádios e as próprias autoridades podem ser responsabilizadas em caso de acidente ou crime num jogo de futebol.


Com o decreto, foi proibida a entrada de torcedores com objetos explosivos e fogos de artifício nos estádios, que passarão a ter câmeras de segurança obrigatórias. Faixas com frases ofensivas aos adversários ou que incitem a violência também estão vetadas. "Queremos transformar o futebol em uma verdadeira festa esportiva, não num evento que deixe um país inteiro de luto", disse o ministro Carlos Romero, um dos defensores do texto. Romero avisou ainda que a investigação do crime continuará sendo conduzida em território boliviano, apesar de uma confissão apresentada por um menor no Brasil. Nesta sexta-feira, os doze torcedores detidos na Bolívia sob suspeita de envolvimento com a morte de Kevin esperam o julgamento de uma apelação entregue ao tribunal local. Eles pretendem responder às acusações em liberdade - eles já prepararam o aluguel de uma casa em Cochabamba para requisitar à Justiça o direito à prisão domiciliar. Mas o advogado que representa os corintianos em Oruro revela pessimismo em relação ao caso. A delegada que cuida do caso afirma ter indícios convincentes de que dois dos torcedores detidos foram os responsáveis diretos pelo disparo, e que os outros dez são cúmplices.

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