Artigo de J. R. Guzzo, publicado na revista Exame, observando que Michel Temer saiu de uma costela do PT "e só chegou aonde está porque serviu em tudo a Lula e aos companheiros":
A “Justiça eleitoral”
(despropósito de fabricação 100% nacional; deveria dar ao Brasil as
eleições mais limpas do planeta, mas jamais conseguiu impedir que a
política brasileira seja controlada por essa massa de escroques que está
sempre aí) julgou em seu Tribunal Superior Eleitoral, a mais alta de
suas instâncias, a seguinte questão: houve irregularidades,
especialmente na parte financeira da campanha do PT e de Dilma Rousseff,
nas eleições presidenciais de 2014?
Por exemplo: correu
tudo direitinho, conforme a lei, com a recepção e o dispêndio dos 300
milhões de reais que a candidata vencedora declarou ter gasto para ser
eleita? A dúvida colocada em julgamento jamais teve a mais remota
semelhança com uma dúvida. Há quase três anos há certeza praticamente
científica de que a campanha eleitoral que levou Dilma à Presidência da
República foi um dos mais prodigiosos episódios de roubalheira jamais
vistos na história universal da política.
Ainda assim, nossos
juristas e demais guardiães da majestade das leis brasileiras passaram
esse tempo todo meditando sobre o caso — será que alguém realmente meteu
a mão em alguma coisa? — e só agora conseguiram levar o caso a
julgamento. A infração era gravíssima: a pena prevista consistia na
perda do mandato para a presidente eleita em 2014 caso tivesse
acontecido alguma coisa de errado com aquele oceano de dinheiro
mencionado acima. Dá para levar a sério? Além do mais, Dilma, deposta
pelo impeachment, já perdeu o mandato há mais de um ano; não era
possível tirar-lhe a mesma Presidência pela segunda vez. É óbvio, em
tais condições, que a esta altura chegamos ao avesso do avesso do avesso
em matéria de disparate.
Se não há mais Dilma
Rousseff, é preciso se contentar com Michel Temer. O processo contra
ela, por essa sequência de aberrações, passou a ser o processo contra
ele. É sensacional. O autor da ação contra a eleição de Dilma é o PSDB,
na época o partido de oposição mais indignado com a ex e com o PT — mas
hoje, desgraçadamente, enfiado até o talo no governo de Temer, seu
sucessor constitucional.
O PT e o
ex-presidente Lula, de seu lado, gritam e mandam gritar todo santo dia
“Fora Temer”. Mas seus advogados no processo do TSE, agindo em defesa de
Dilma e da perfeita lisura da campanha de 2014, ficaram
obrigatoriamente contra a cassação da chapa — e, por via de
consequência, como diria o falecido vice-presidente Aureliano Chaves, a
favor de Temer e de sua permanência no cargo. Ficamos, então, diante de
um xeque-mate que diz tudo sobre como o Brasil é governado hoje: o TSE
conseguiu o feito de condenar-se a escolher entre duas decisões erradas.
A história toda é
acompanhada de algum lugar seguro, provavelmente às gargalhadas e com
champanhe, pelos irmãos Wesley e Joesley Batista — possivelmente os
maiores corruptores confessos que já apareceram no Brasil nos últimos
500 anos. Receberam, em troca de suas confissões, um inédito perdão da
Procuradoria-Geral da República e de um ministro do Supremo Tribunal
Federal. Não uma redução de pena ou algum benefício compreensível; foi
uma absolvição sem julgamento. Talvez aguardem, agora, a medalha da
Ordem do Rio Branco.
O quadro se completa,
até agora, com a constatação de que ninguém governa. Na verdade, desde
que a maioria dos eleitores brasileiros tomou a funesta decisão de dar
um segundo mandato à ex-presidente Dilma, o país vive sem governo. Dilma
não governou de 2014 para cá, e Temer não governa desde seu primeiro
dia no Palácio do Planalto, ou governa apenas um bazar de trocas.
Além disso, saiu de
uma costela do PT e só chegou aonde está porque serviu em tudo a Lula e
aos companheiros. Não poderia ser diferente do que está sendo, pois não
apagou seu passado quando subiu de cargo; ninguém consegue. Toma, agora,
o mesmo remédio que viu Lula e o PT aplicar em todos os adversários.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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