Por Redação BNews | Fotos: Estadão
Um dos fundadores do PSDB, partido que se formou em torno da tese do
parlamentarismo, o senador José Serra (SP) defende a aprovação do
sistema de governo, que voltou à discussão com a votação da reforma
política no Congresso, valendo não para o ano que vem, mas para as
eleições de 2022 e sendo implementado em 2023.
Em entrevista concedida ao jornal Estadão, o ex-ministro das Relações
Exteriores do governo Michel Temer afirma que o presidencialismo no País
tem sido um “fracasso histórico”. “No parlamentarismo, a troca de
governo é uma solução. No presidencialismo, é uma crise”, afirmou Serra
ao Estado.
Crítico do chamado distritão, o senador disse que há negociações para a
aprovação agora do modelo que elege os candidatos mais votados contando
que, em 2022, vigore o distrital misto, que, para o tucano, aumentaria a
legitimidade democrática. “Acho que seria uma mudança crucial.”
Na entrevista, Serra não quis falar sobre a propaganda do PSDB, a nova
crise interna do partido e a antecipação da disputa eleitoral de 2018.
A Câmara dos Deputados pode votar a reforma política nesta
semana, alterando o atual sistema eleitoral para o chamado distritão.
Será uma espécie de transição mesmo para o distrital misto que o senhor
defende?
O distritão elege os mais votados, o que enfraquece muito os partidos e
dá um peso econômico para a eleição muito grande. Tenho um pé atrás com
isso. O que está empurrando para esse modelo agora é o financiamento
público de campanha, que pega muito mal na opinião pública e que sou
contra. Defendo o distrital misto, onde se divide o Estado em distritos e
cada um elege um deputado distrital. Aí, o candidato pode fazer
campanha até de bicicleta. E como é misto, o eleitor vota no candidato e
no partido, assim como na Alemanha. Os partidos lançariam menos
candidatos, sem dúvida, e se gastaria menos. E ainda tem a questão da
legitimidade democrática, que aumenta. O eleitor passa a se lembrar do
nome de seu candidato e pode cobrar mais facilmente. Temos de mudar a
forma de se fazer eleição para contribuir para moralização e maior
representatividade democrática.
Há garantia de que seria implementado em 2022?
Estamos procurando uma maneira de negociar para daqui a quatro anos,
para valer a partir de 2022. A ideia é que se vote agora e que se crave
na Constituição que nas eleições seguintes haverá o distrital misto. Não
dá tempo de implantar no ano que vem, mas acho que seria uma mudança
crucial.
Como o parlamentarismo entra nisso?
Aí é outra questão. O parlamentarismo é o sistema de governo. No
Brasil, o presidencialismo tem sido um fracasso histórico. Temos sete
presidentes que não terminaram o mandato, desde Getúlio Vargas, que se
deu um tiro, até a Dilma (Rousseff). Em todos os casos houve uma grande
crise. No parlamentarismo, a troca de governo é uma solução. No
presidencialismo, é uma crise.
Mas essa mudança nem sempre colabora para a estabilidade
política. A Itália, por exemplo, teve mais de 60 governos diferentes em
70 anos. Isso é bom?
A Itália, sobretudo, até os anos 1980, se desenvolveu muito, consolidou
sua democracia ao jeito italiano. É ruim, mas não é uma desgraça. Você
tem mudança de governo, em certos períodos de maior de instabilidade,
mas não é a legitimidade democrática que é contestada. E mais, no
parlamentarismo, você está obrigado a ter um funcionalismo com concurso,
preparado, com uma margem de cargos de comissão infinitamente menor.
Também valeria para 2022?
Defendo que se aprove, neste ano ou no começo do próximo, a adoção do
parlamentarismo no Brasil a partir de 2023. Até lá, que sejam adotadas
as medidas para adoção do sistema. E essa crítica de que no
parlamentarismo os deputados teriam muita força é falsa porque eles já
têm no presidencialismo ou não têm?
Se os parlamentares já exercem essa força, por que mudar?
No parlamentarismo, o voto deve ser mais responsável. Isso porque se o
projeto não passa, o governo corre o risco de cair. Compartilha-se mais a
responsabilidade.
O presidente Michel Temer chegou a cogitar nomear um
primeiro-ministro ainda durante seu governo, ou seja, até 2018, caso
aprovada a mudança, como uma espécie de teste.
Não seria contra a ideia, imagina, mas acho que não dá tempo.
O senhor seria um bom nome?
Não pensei nisso. Mas a minha vocação é para a vida pública, tanto no
Legislativo como no Executivo, de maneira que se tiver um novo sistema
vou estar aí, como sempre estive no caso do presidencialismo.
Não descartaria então essa função?
Não me venha com essa, senão vão achar que estou pregando em causa
própria. Houve até quem brincasse com isso. Como o Serra não se elegeu
duas vezes presidente, ele quer o parlamentarismo para ser o
primeiro-ministro.
Está errado?
Sim, quero o parlamentarismo pelo País, não por mim.
Essa é uma bandeira antiga do senhor. Por que agora seria o momento de adotá-la?
Tivemos duas quedas de presidente desde a reabertura do processo
democrático. Isso mostra a instabilidade do sistema presidencialista.
Temer já teria caído se o Brasil fosse parlamentarista e ele, primeiro-ministro?
Não sei, pode ser que não. Pode ser que o governo dele tivesse sido
reafirmado depois de um voto de desconfiança. No parlamentarismo é
assim: você apresenta democraticamente um voto de desconfiança do
governo e se o Congresso aprova, o governo cai e o presidente indica
outro primeiro-ministro capaz de formar maioria.
Há condição de se aprovar tantas mudanças significativas até o início de outubro?
De se aprovar tem, de se implantar, não. Por isso defendo tanto o
distrital misto como o parlamentarismo para 2023, já valendo nas
eleições de 2022. Daqui até lá tem de ter preparo, senão não vai
funcionar. Na política é preciso vencer dificuldades, transpor
obstáculos. Estou convencido de que o melhor pode prevalecer. Política
para mim não é a arte do possível, é a arte de ampliar os limites do
possível.
A população deve ser consultada em um novo plebiscito para a adoção do parlamentarismo?
Se tiver, que se faça, mas com uma boa campanha para explicar o sistema à população. Vai ganhar desta vez.
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