por Aninha Franco CORREIO
Hoje, há 262
anos, o poder português enforcou e esquartejou Joaquim José da Silva
Xavier, o Tiradentes da cidade de Vila Rica, nas Minas Gerais, porque
ele e mais dezenas de outros, entre os quais os poetas Cláudio Manuel da
Costa e Tomás Antônio Gonzaga, conspiraram contra o regime tentando
afastá-lo do Brasil. Dos acusados, Cláudio se enforcou na cela e
Tiradentes, o mais pobre deles, foi condenado à morte, esquartejado com
vários pedaços do corpo distribuídos em locais estratégicos das Minas, e
a cabeça no lugar onde o esquartejado morava, para servir de exemplo a
possíveis seguidores.
A sentença a Tiradentes exibe a forma como Portugal
tratava os que pretendiam usurpar-lhe a colônia: “Portanto, Portugal
condena o réu‚ Joaquim José da Silva Xavier, alferes da tropa paga da
capitania de Minas, que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas ao
lugar da forca e nela morra de morte natural, para sempre! (...) e que
depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, aonde em
lugar mais público seja pregada em poste alto, até que o tempo a
consuma. (...) Declaram ao réu infame e infames seus filhos e netos, e
seus bens serão confiscados pela câmara real. (...) E a casa que vivia
em Vila Rica seja arrasada e salgada, e que lá nada mais se edifique.
(...) E no mesmo chão onde está esta casa se levante um padrão pelo qual
se conserve em memória a infâmia desse abominável réu (...)”.
Logo
depois, quatro baianos foram enforcados por ordem de Portugal na Praça
da Piedade por pretenderem separar o Brasil do Reino e, mais que isso,
acabar a escravização na Colônia, extinta em 1888, e a igualdade de
direitos dos seus brancos e negros. Não, a trilha de hoje não é uma
anotação histórica sobre as lutas de libertação do final do século 18, é
sobre como nós evoluímos pouco nesses últimos 200 anos. E como estamos
evoluindo rapidamente nos últimos 20 anos, talvez graças aos projetos
dos garotos do Vale do Silício. Sim, eles são jovens e praticam
burradas, mas possivelmente sem querer alteraram para sempre a história
da opinião no planeta, sem que dessa vez o Brasil tenha ficado de fora.
A opinião está ao alcance de todos pela primeira vez
neste Brasil onde ter livros sempre foi perigoso e onde só foi
permitido publicá-los depois que um português separou a colônia do
colonizador e se tornou seu imperador. Sim, o Brasil foi libertado por
seu opressor na sequência de loucuras históricas que os brasileiros
vivem desde o princípio e continuam vivendo agora.
Agora, a opinião está convivendo com milhares de
manifestações, algumas explosivas, algumas desatinadas, algumas
profícuas, todas expostas nas redes ou na imprensa depois de décadas
republicanas de autoritarismo, de censuras, repressões e mortes.
Recomenda-se àqueles que falam “do golpe de 2016”, que leiam o conteúdo
do AI-5 que acuou o Brasil de 1968 a 1978, sem que o habeas corpus
pudesse ser requerido.
Quando isso tudo é possível no Brasil onde há 130
anos, no mês de abril, havia humanos escravizados andando nas ruas, e
onde há 48 anos se alguém publicasse este texto seria preso e, quem
sabe, esquartejado, é preciso comemorar a liberdade da opinião,
lembrando dos que morreram em seu nome.
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